Em determinado momento da minha vida eu estudei no ensino fundamental. Era bem bacana, só brincadeiras e risadas, ao menos eu acho que era assim porque não consigo lembrar de muita coisa.
Em particular eu lembro vagamente de uma situação que por alguns dias colocou a minha visão de como o mundo funciona em cheque, para logo em seguida me ensinar a não acreditar em tudo que as pessoas te dizem, mesmo que essa pessoa seja uma autoridade e/ou uma pessoa que você admira.
Certa feita, na primeira ou segunda série (eu realmente não lembro qual - algo me diz que foi na segunda, mas eu também tenho uma memória da professora da primeira antagonizando a cena) - fomos instruídos a escrever uma redação sobre as nossas férias - uma prática muito comum em escolas do nível fundamental, aparentemente tão comum que a prática se repetiu ao menos uma vez por ano até a quinta série.
A tarefa era para casa e eu ainda não tinha concebido alguns macetes escolares como fazer a atividade antes e poder ficar de boas mais tarde então eu levei a tarefa para fazer na minha humilde residência.
Ao contrário do ReLapso anterior, que se passava na pré-escola, no primário a gente já escrevia com alguma proficiência, tropeçando mais em pontuações, acentos e palavras começadas em H, então eu escrevi um texto satisfatoriamente inteligível, o qual eu solicitei que a minha mamãe desse uma lida antes de eu entregar com orgulho para a professora.
Determinado ponto desse texto continha o seguinte verbete, que é muito comum no vocabulário brasileiro e tem um significado praticamente universal: "Final de semana".
Final de semana esse que, se não me engano, foram o sábado e domingo antecedentes à segunda-feira do primeiro dia de aula, data em que foi passada a tarefa que logo sucedeu a terça-feira em que a redação foi entregue.
A professora, no horário de aula, enquanto a sala fazia desenho livre ou brincava de massinha de modelar ou seja lá que tipo de estripulia nós fazíamos, chamou a minha atenção sobre a minha redação.
- Está muito boa, querido, mas o que quer dizer com 'Final de semana'?"
- Ué prô (eu fiquei um pouco intimidado, pois segundo minha mãe não tinha erro nenhum) é o sábado e depois o domingo.
- Aaah, mas isso não é o final de semana.
Buguei.
Como assim mulher? Como a senhora vem me dizer que um final de semana não é a droga do sábado e o maldito domingo? Tipo, todos os brasileiros, talvez todos os SERES HUMANOS concordam que o final de semana são esses dias!
- O domingo é o primeiro dia da semana. O final da semana é apenas o sábado.
Ah.
Uma explicação embasada, até que faz algum sentido.
O domingo é o primeiro dia, logo não faz parte do "final".
Claro.
- Mas prô a gente em casa sempre falou final de semana
- Final de semana é só o sábado! Domingo é no começo. A gente já começa a semana descansando!
A professora solicitou que eu corrigisse a minha redação (que obviamente estava escrita à lápis) e eu apaguei "final de semana" e espremi naquele mesmo espaço "sábado e domingo" para devolver a tarefa e o texto continuar com o mesmo sentido.
Eu matutei na nossa conversa durante algum tempo - tempo o suficiente para a minha mente registrar como ReLapso - mas dali a alguns dias eu cheguei à conclusão de que a professora era a única pessoa do mundo que não incluía o domingo em seu "final de semana".
Então, talvez ela estivesse errada, no fim das contas.